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Crônicas da pandemia

100 mil é o limite

Alguns setores de Pará de Minas (parte da mídia, entidades classistas e prefeitura, entre outros) mostraram-se indignados pelo fato de o IBGE ter anunciado que a população da cidade ainda está longe dos cem mil habitantes. Diz o instituto que em 2020 somos pouco mais de 94 mil felizes residentes nesta terra “dos teares e dos sinos” como canta o nosso hino municipal. Como consolo restou a informação de que somos seiscentos e poucos patafufos a mais que os ciriricas de Itaúna. Nos idos até os anos 1960 chamar um itaunense de  ciririca ou um paraense de patafufo, era uma espécie de grito de guerra, com as duas tribos partindo para o embate, principalmente nos campos de futebol, nas pelejas entre Paraense X Sport Clube Itauna.

Se depender de mim Pará de Minas jamais alcançará o centésimo milhar de habitantes. Eu sou daqueles que acreditam que nenhuma cidade precisa de cem mil habitantes para ser  uma urbe feliz. Para mim o limite é 99.999.  A partir dos cem mil habitantes as prefeituras passam a receber um aumento substancial na sua cota do sempre citado FPM – o Fundo de Participação dos Municípios, onde vai cair tudo aquilo que os municípios arrecadam  e  que a eles retornam em quantidade proporcional á quantidade de habitantes.

  Eu não vou gostar de viver numa cidade de 100 mil, ou 120, ou 150 mil habitantes, onde alguns poucos milhares terão boa qualidade de vida, enquanto as outras muitas dezenas de  milhares de moradores estarão vivendo em condições precárias. Eu prefiro uma cidade ao  molde da Pará de Minas de hoje, que mesmo com “apenas” 94 mil moradores, a maioria já passa por agruras de uma megalópole (para mim, passou de 200 mil habitantes é uma megalópole).

Eu quero viver numa cidade onde todos os moradores tenham um serviço de saúde pública pelo menos razoável, com menos politicagens e mais médicos e profissionais da área (enfermeiros, etc.); eu sonho com uma cidade com escolas públicas de qualidade, com professores qualificados desde o 1º ano até o último ano do ensino médio. eu quero viver numa cidade onde o que é ensinado nas escolas públicas vá muito além desse ramerrame atual; eu quero a volta do ensino de música, onde os alunos aprendam a solfejar e a ler uma partitura, a soprar um saxofone, ou estardalhar  na bateria. Eu quero a volta das bandinhas escolares e das fanfarras. Eu quero a volta do caderno de caligrafia e da matéria OSPB; eu quero viver numa cidade onde, pelo menos as escolas municipais promovam as semanais “hora cívica” com a execução  dos hinos. Eu quero viver numa cidade onde o(a) secretário (a) de Educação não passe de mero gerente de recursos humanos, transferindo professores daqui para ali, contando tempo de serviço para servidores mal acostumados. Eu viver numa cidade onde o secretário(a) d Educação introduza métodos contundentes que atraiam alunos e não que os expiante. Em outras cidades isto acontece, aqui pode acontecer também.

Eu quero viver numa cidade cujo único teatro tenha apresentações pelo menos quatro noites por semana, sendo duas delas sem cobrança de ingressos. E que o teatro não seja apenas um “closet” com dezenas de cabides pendurados. Nosso teatro vai completar dez anos  e não foi criada ainda uma  companhia teatral na  cidade digna deste nome; que leve ao palco não apenas a modinha de de nome “stand up”, seja lá qual seja o significado desta expressão. O teatro, ou melhor, os dirigentes do teatro, precisam saber no mínimo quem foi Geraldina Campos, que dá nome à casa. Sem dúvida a grande dama dos nossos  palcos: autora, diretora, eventualmente atriz e cenógrafa. Ainda na década de 1930 criou um grupo artístico que brilhou nos trinta anos seguintes. Eu quero viver numa cidade que ofereça aos seus jovens cursos de teatro na periferia, nos salões comunitários, por que não? As pessoas ligadas à Cultura em Pará de Minas precisam sair desta zona de conforto em que vivem, agarradas pelo umbigo ao salário bem bom que o erário municipal lhes paga.

Eu quero viver numa  cidade onde os espaços públicos, praças e coretos sejam ocupados por grupos locais de atores, músicos, artesãos. E que os sem-teto que atualmente habitam esses espaços sejam protegidos e encaminhados a locais apropriados.  Eu quero viver numa cidade cuja banda de música seja capaz de executar o Hino Nacional. eu quero viver numa cidade que tenha uma banda de música de verdade; se for preciso pagar um cachê aos músicos que seja pago. E cobrar presença deles nos ensaios e nos estudos.  Neste caso sugiro cortar dois ou três aspones culturais com salários bem bons e convertê-los em cachê aos sopradores de tuba, ao camarada dos pratos e a todos os demais integrantes da nossa euterpe (epa!!!). Eu quero viver  numa cidade com menos de 100 mil moradores, que ofereça a todos eles, indistintamente: boa saúde,  boa educação e atividades culturais relevantes. Eu não quero viver num formigueiro humano.

Entendam o texto como se crônica fosse; mas na verdade não passa de sugestões  aos  programas de governo da dezena de candidatos a prefeito da cidade. Mesmo sabendo que todos eles sonham com um Pará de Minas não apenas com míseros 100 mil moradores; querem mesmo é uma urbe com 200 mil almas penantes nesta triste mesopotâmia mineira. (LUIZ VIANA DAVID)

Luiz David

2 Comments

  1. Enquanto ainda sonhamos, Luiz David, é sinal de que nossa esperança continua firme. Esperança é algo construído, alimentado, almejado. Não cai do céu. É o que será ou melhor, o que desejamos que seja. Que bom que ela seja parte de você.

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