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JOAQUIM LÚCIO, PARA O POVO UM SANTO

Joaquim Lúcio foi um pará-minense que deixou vasta descendência em Pará de Minas. Na juventude foi arrieiro de viajantes e conheceu muitos estados e dezenas de cidades. Faleceu em 23 de agosto de 1959, aos noventa anos de idade. Desses noventa anos de vida, passou nada menos do que sessenta anos e quatro meses numa cama. No apagar das luzes do Século 19, Joaquim Lúcio vivia em Pitangui, após ter abandonado o trabalho de tropeiro. Por esta época foi acometido de um forte resfriado, que degenerou na paralisia que o deixou prostrado pelo restante de sua longa existência.
O fazendeiro, político, escritor e poeta, José Augusto Corrêa de Miranda, era amigo de Joaquim Lúcio e poucos dias antes de o acamado morrer, visitou-o em sua casa que ficava na Rua João do Neto, nº 90. Em seu livro “De Patafufo a Pará de Minas” José Augusto conta como foi a sua derradeira conversa com o amigo: “Em minha última visita perguntei-lhe o que tinha para me contar naquele momento e ele respondeu-me: ‘Toda minha vida já é do seu conhecimento, só tenho a acrescentar que vou completar por estes dias noventa anos de idade e, sessenta anos e quatro meses foram como você sempre viu e está vendo, passados nesta cama com o corpo cansado, ferido e me faltando sono; passo as noites contando horas; até pouco tempo via e conhecia as pessoas que me visitavam, agora… estou cego…’ É esta a história do homem que, em Pitangui, era conhecido por Joaquim do Pará”.

Eu cheguei a conhecer o velho Joaquim Lúcio, que tinha para o povo paraense o “status’ de mártir. Eu tinha doze anos e minha família tinha voltado a viver em Pará de Minas poucos meses antes dele morrer. Éramos vizinhos na Rua João do Neto. Eu o via através da janela que era bem bem grande, eu nem precisava ficar na ponta dos pés para vê-lo, mas infelizmente ele já estava finalizando o seu tempo na terra e nunca troquei com ele sequer uma palavra. Lembro-me que quando ele morreu, lá em casa foi como se tivesse partido alguém da família, pois Joaquim Lúcio tinha sido um grande amigo de meu avô Juca David; e meu pai (José David Netto-o Negrito) tinha por um filho de Joaquim Lúcio, de nome José Lúcio, a estima de um irmão. A amizade entre nossas famílias perdura ainda hoje, graças a Deus.

O citado escritor José Augusto comenta em sua obra como foi o enterro de Joaquim Lúcio: “faleceu no dia 23 de agosto de 1959 e o seu sepultamento no mesmo dia, foi digno de admiração pelo elevado número de pessoas todas as classes sociais que o acompanharam à sepultura, cheios de respeito e comovido silêncio, como e acompanhassem o enterro de um santo”.

Santo. Se em vida Joaquim Lúcio era venerado como mártir, depois de morrer, passou a ser lembrado como Santo. Seu túmulo no Cemitério Municipal passou a ser o mais visitado pela população. Na celebração de “Finados” anualmente, chegou-se em certos anos a se formar uma fila de pessoas, que iam pedir ou agradecer por graças alcançadas através de Joaquim Lúcio. Ele foi casado dona Maria das Dores de Jesus (1874/1961). Tiveram seis filhos: Lindorifo, Geraldo, Joaquim, José Lúcio, Maria e Clotilde.

No livro que eu editei em 2009, “Pará de Minas Meu Amor -100 Anos de Histórias e Estórias”, uma coletânea que contou com a participação de trinta autores paraenses, o neto de Joaquim Lúcio, Nilton José de Faria, o Nilton Pintado, escreveu uma bela crônica sobre o avô. Um trecho diz: “Meu avô morava numa casa na Rua João do Neto, número 90, uma casa antiga, de muitas janelas baixas na frente, de modo que as pessoas podiam vê-lo em seu leito. Sua cama ficava de frente para a porta que dava acesso ao quarto; a porta tinha uma corda que ficava presa ao trinco, de modo que meu avô podia abri-la quando precisava chamar alguém, ou para que a corrente de ar fluísse… A casa estava sempre cheia de visitas; pessoas daqui e de outras cidades vizinhas estavam sempre por lá para um dedo de prosa e também para sorver um pouco da sabedoria adquirida pelo meu avô, durante suas andanças como tropeiro. Aos domingos então, era quase uma festa… O número de visitantes quase dobrava. A paciência de meu avô e a sua fé em Deus, não passavam desapercebidas, e as pessoas começaram a creditar que alcançavam graças por meio das orações que meu avô fazia.
Políticos locais e outros em visita à cidade, também frequentavam a casa.

Notas:
José Augusto Corrêa de Miranda foi primeiro Presidente da Câmara Municipal de Pará de Minas, após a redemocratização do país em 1947.

Nilton José de Faria, o Nilton Pintado, neto de Joaquim Lúcio, nasceu em 1935. Nos anos 1950 consagrou-se como uma das estrelas do melhor time do Paraense E.C. de todos os tempos. Era atacante. É um emérito contador de “causos”, e uma de minhas fontes de inspiração sobre as coisas do pará antigo. Nilton Pintado, foi representante comercial e está aposentado há muitos anos.

Luiz David

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