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Lugares do prazer em Pará de Minas

Lugares do prazer em Pará de Minas

Um crônica de: Lúcio César de Faria

Segundo a ciência, o ser humano está habilitado a gravar lembranças a partir dos 4 anos. O que pode ser regra geral, mas deve haver exceções, pessoas de prodigiosa memória. Conheço algumas que, sem exagero, devem se lembrar ainda da corrida de espermatozoides em direção ao óvulo. Uma delas foi além, dizendo lembrar-se do piquenique de seus pais antes da relação em que foi concebido. Não duvido, pois o conheço muito bem e admiro sua memória em relação a Pará de Minas e seu passado. Para situar os leitores, nasci, como costumo dizer, para me consolar, no início da segunda metade do século passado, mais precisamente em 1955. Então, começarei a falar aqui dos anos sessenta, indo até a adolescência, em 1970.Os quintais de casas em que moramos em Pará de Minas eram “arenas” para o meu irmão Geraldo e eu. Na casa da rua Dr. Higino, o perigo era quando a bola caía na casa no quintal do Sr. Pio, cuja esposa ameaçava furá-la, o que equivalia a nos dar uma facada no coração. Quando a bola caia lá, tínhamos de sair pela rua afora em busca de um dos filhos, Chico e Luiz, para resgatar a esfera.

Além dos quintais das casas em que moramos e, quando chovia, do corredor ou de qualquer cômodo, meu primeiro espaço externo de futebol foi na casa da família Ribeiro, dos irmãos Mário, Arnaldo e Celso, onde hoje é o prédio do INSS, na rua Direita. Naquele quintal, por volta dos meus 5 anos, com meu irmão, Geraldo Magela, ensaiava os meus primeiros chutes. Se a bola era um desafio a ser domado, pior ficava com uma árvore bem no centro do campo. Depois dessa estreia espetacular nas terras patafufas, o segundo local das minhas atuações foi a entrada do campo do Paraense, entre a linha do trem de ferro e o Ribeirão Paciência, sugestão, acreditem, feita por nossa mãe, Geralda. Aqui já estou aos 7 anos de idade. Terminada a aula no Grupo Escolar Torquato de Almeida, saia correndo para trocar de roupa em minha casa na rua Doutor Higino, colocava a bola debaixo do braço e descia em direção à Estação, cruzando com colegas ainda conversando na saída do grupo. Passava pela Praça da Estação e era seguido pelos engraxates que ali faziam ponto. E logo rolava a pelada. Chegamos até a organizar um campeonato ali, cujas arquibancadas eram pilhas de dormentes da antiga Rede Mineira de Viação, naquele tempo já transformada em Viação Férrea Centro-Oeste.Ali, quem chutasse a bola no ribeirão tinha que buscar. E um dos amigos quase afogou-se em um dia pós chuvas, em que as águas do Paciência, acredite quem quiser, estavam revoltas. Agarrou-se a um galho na beira do ribeirão e foi resgatado por outro amigo, com a bola nas mãos, naturalmente. Costumávamos jogar às vezes em um espaço atrás do gol do campo do Paraense, entre o alambrado do campo e o muro que dividia o espaço com a quadra, que depois foi incorporado ao campo. No “buracão”, nunca joguei, mas estive lá certa vez para conhecer. Ficava na rua Artista Benjamim Oliveira, com acessos pela rua Coronel Domingos ou Capitão João da Cruz. Segundo o meu amigo Luiz Viana David, foi ali que se revelaram Calé, Jorge Madalena, Quiquites e todo o time do Continental, e muitos outros. O lugar hoje é uma área aberta, sendo o limite de quintais de todas as ruas citadas e a área no meio.

Os campos do Ginásio eram um luxo. Tinha o campão, de tamanho oficial e o campinho, atrás dele, cujo comprimento era a largura do campão. Eram num dos dois os jogos do time fundado por meu irmão Geraldo, que, apesar de flamenguista, deu o nome de Vasco da Gama, por causa do uniforme emprestado pelo Ari Coutinho Júnior, do Continental. Entre 14 e 16 anos, moramos na Rua Vigário Paulino, 127, numa casa em que o quintal, cheio de árvores frutíferas, ia de um quarteirão ao outro, da rua Sacramento à rua Dr. Lage, que até então não havia sido totalmente aberta. Ali também fizemos um campinho, com uma pequena descida. Lembro-me até de um jogo contra o time da turma da rua Sacramento, em que eles chutavam a bola longe para atacar o pé de mexericas. Meus amigos acham exageradas minhas afirmações, mas o futebol feminino nasceu em Pará de Minas, mais precisamente na rua Vigário Paulino. Jogávamos na rua, uma descida, com duas curiosidades: a participação de uma menina e com sua bola de vôlei! Nessa época, formos algumas vezes, de caminhão, com o Adolfo Rezende, tio do Oscar Marçal, colega do meu irmão Geraldo, jogar no campo de tamanho oficial, de terra, da Parapuan, na Av. Ovídio de Abreu. Todo espaço servia para improvisar um campinho. Traves sempre de bambus, quando se chutava uma bola no travessão, o goleiro ficava dividido entre o perigo de o bambu cair na cabeça dele e o rebote. Lembro-me de ter jogado contra o Cruzeirinho, em que atuavam o Adalton Carvalho e o José Osvaldo Marinho (Jota), o craque do time. Numa ocasião foi no campinho em terreno ao lado da Delegacia e, noutra, no campinho que ficava ali pela região subindo depois do campo do Guarani. Segundo o amigo Adalton, é onde está situada a Plena Alimentos (R. Martinho Campos, 21, São Cristóvão). Havia um pequeno córrego ou esgoto, que eles desviavam quando estavam atacando para aquele lado e depois abriam para os adversários sambarem nos seus ataques.Mas o paraíso de prazer era o campo do Paraense. Na primeira vez que joguei lá estava com uma turma de meninos assistindo ao treino do Paraense e, ao final, um mais audacioso, salve engano o Barol, pediu ao Bruno Marinho para jogarmos um pouquinho e ele deixou. Imagine um bando de meninos saindo da arquibancada para pisar e, ainda melhor, jogar naquele tapete verde, oficial, que o Bruno Marinho tratava como se fosse um jardim do Éden!

Hoje, a meninada é colocada cedo em escolinhas de futebol, de grama sintética ou natural, com os melhores tênis e bolas. Se eu fosse professor de uma dessas escolinhas, começava por fazê-los jogar na terra, com bola de plástico tipo aquelas “Dente de Leite” de antigamente. Se você aprende a dominar uma bola de plástico, em dia de ventania, depois que ela quica numa das pedrinhas do campo, você será capaz de dominar o mundo!

40Emídio Silva, Lesio David e outras 38 pessoas9 comentáriosCurtirComentar

Luiz David

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