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Meu Pai, Eu e Hugo Marinho

Hoje, 26 de julho,  transcorre o 104º aniversário de nascimento de meu pai, José David Neto, O José Negrito,  que faleceu precocemente aos sessenta e três anos, nas vésperas do natal de 1977. Uai!!!! Vai exclamar o leitor dessas mal traçadas linhas: -precocemente com mais de sessenta e três? Sim, eu respondo e acrescento: então vocês não sabem que os David de Pará  de Minas são famosos também pela longevidade? Pelos parâmetros “davididanos” meu pai fez a passagem ainda bem moço, se comparados com meu avô Juca David que subiu aos setenta e sete; ou com as tias dele: Isabel -Bé David, que mudou de andar aos cem anos, Tia Ica aos noventa e oito, tia Maizé aos noventa e cinco, tio Antônio aos oitenta e dois; os primos Ida e Antônio Walter, filhos da centenária Isabel, partiram aos noventa e três e noventa e quatro anos respectivamente. Tio Ciano (Maximiano) viveu mais de oitenta. A única irmã de meu pai, Raimunda David Ferreira, a minha querida Dinha Mundica, foi-se aos noventa e seis.  Meu bisavô David Indalécio da Silva, não era chamado de “David Velho” a toa: morreu com noventa anos, em 1942, época em que a idade média dos brasileiros era quarenta e oito anos.

De vez em quando um de nós parece vacilar e sobe antes de atingir nossa média. Geralmente vitimados por um câncer, como foi o caso de meu pai, que era também portador de enfisema pulmonar: aí amigos, não há  David que resista, pois somos longevos,  não somos imortais. Numa família de moderados bebedores de cervejas e cachaça, alguns se excedem no consumo da “marvada pinga” e são fisgados pela cirrose, que também acomete quem só bebeu água na vida.    Ou então podemos ser vítimas de alguma fatalidade, como foi o caso do saudoso primo José David Sobrinho, o inesquecível Zé da Bia, que perdeu a vida em 2001, aos sessenta e três anos,   em acidente rodoviário na BR 262, , pilotando um caminhão da prefeitura de Pará de Minas, carregado de asfalto.  Quem não se lembra do Zé da Bia? Dotado de um bom humor que extravasava, de enorme senso de solidariedade; que grande profissional; pai e marido amoroso. Eu sempre achei que Pará de Minas ficou meio sem graça desde que morreu o Zé da Bia. Se me pedirem para citar um nome que sintetize o jeito de ser só nosso, descendentes de David Velho, eu digo: com certeza, Zé da Bia! Que além do mais,  foi um grande atleticano, ao ponto de em 1971 encher uma kombi com amigos e ir ao Rio de Janeiro assistir ao vivo no velho Maracanã, o Galo conquistar o primeiro campeonato brasileiro de clubes. Zé da Bia estava convicto da vitória do Galão e nos anos seguintes “carteava uma marra” (acho que ninguém mais fala esta gíria): fui, vi e venci, para comentar sobre a histórica viagem ao Rio.

Então somos assim, orelhudos e vivemos muito. Também não enricamos, mas desconheço algum descendente de vovô Indalécio que viva na pindaíba absoluta, no miserê total. Sempre encontramos um travesseiro macio onde repousar nossas cabeças.                      Maridos e mulheres de davidianos quase nunca ficam viúvos, salvo as exceções já mencionadas, que confirmam a regra.  Por isto aconselho aos meus parentes casados, agora apenas irmãos e primos, que tratem de extrair um bom pecúlio de seus respectivos maridos e mulheres, que lhes garanta uma velhice boa, pois longa,  podem apostar que será.

Aí, o leitor já impaciente, pergunta: – Por que o nome de Hugo Marinho está lá em riba, no título da crônica?  E eu,  de “prima” respondo: só porque ontem, 25 de julho, transcorreu o centenário de nascimento dele. Hugo Marinho foi sem dúvida umas das personalidades mais marcantes do Século XX em Pará de Minas. No livro “Minhas Memórias do Futebol” eu conto várias passagens do lendário personagem como dirigente do Paraense Esporte Clube, do qual foi co-fundador em 1936 e depois atleta por vinte anos.Na década de 1960 foi também diretor do Cruzeiro, convidado pelo presidente Felicio Brandi.                                                                       Hugo foi também vereador, presidente do Centro Literário, apoiou todas as causas que envolviam o progresso e o desenvolvimento de nossa cidade. As pessoas o chamavam de louco, outras diziam que era meio zureta. Certa vez conversando com uma veneranda senhora, que foi colega dele no grupo escolar, ela disse: – Meu Deus, como Hugo Marinho era peralta. Esta palavra a gente costumava ler muito em tempos mais antigos, quando as pessoas sabiam escrever,  mas eu mesmo estou escrevendo-a pela primeira vez. Diz o “Hoauiss” (o dicionário) que peralta é o sinônimo de criança travessa. Hugo Marinho morreu no ano de 2018, aos oitenta anos, sempre teve enorme apreço pela minha família e pelos davidianos em geral. Ao ponto de convencer meu pai a mudar o meu nome, quando foi ao cartório registrar meu nascimento. Ele disse ao meu pai: Negrito, esse menino não pode se chamar Luiz Carlos. Vão pensar que você está querendo homenagear o Prestes (Luiz Carlos Prestes, maior líder comunista do Brasil, na época senador da república). Meu pai então deve ter coçado o queixo antes de responder: – então muda aí Hugo; coloca Luiz Viana David, o que sempre deixou-me intrigado, pois além de mim, na família só meu avô Juca, pai de meu pai, tinha esse “Viana” no nome, que vai comigo para o túmulo. Afinal de contas, ser pai depois dos setenta costuma ser uma proeza, até para nós, dos David, de Pará de Minas.

Voltando ao Hugo Marinho, acho que ele foi um pouco de tudo aquilo que foi chamado: louco, zureta, peralta, mas foi também um poeta; lembram-se do “Mário Pequeno” que escrevia na Gazeta Paraminense? Pois é.

Mas acho que Hugo Marinho foi principalmente um visionário. E onde ele estiver receba meu abraço pelos cem anos.

Tin Tin, Cubu!

Luiz David

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