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Mudei eu ou mudou o futebol?

MUDEI EU OU MUDOU O FUTEBOL ?

O primeiro craque que eu vi num campo de futebol se chamava Zé do Bamba. Simplesmente Zé, pois Bamba era um time que havia na várzea de Belo Horizonte, na segunda metade dos anos 1950. Pelo nome do time dá para se notar que cabeça de bagre não envergava sua camisa. O Zé era um malabarista com a bola. E eu, moleque que nem dez anos tinha, ficava pensando porque o Atlético não o contratava. Diziam que o Zé era de família endinheirada e que não precisava jogar futebol profissionalmente, preferindo esbanjar categoria nos campos carecas da várzea belorizontina. De vez em quando ele dava uma canja no time do Magnesita E.C., da Cidade Industrial de Contagem, que era o meu time do coração na várzea. O nome dele era Zé e o do time era Bamba.

Na mesma época havia um outro time de várzea com o nome sugestivo de “11 Aventureiros”. Um outro se chamava Rosário E.C; e outro ainda “Reis da Bola”. Em Pará de Minas tivemos o Pio XII, o D. Bosco, o Santos e o Flamenguinho.

Craque talentoso era chamado de “Divino” como Domingos da Guia, na década de 1930. Trinta anos depois o filho dele, Ademir, também foi chamado assim. Um dos maiores craques que eu vi jogar incorporou o nome Tostão e pronto. Um colega dele no Cruzeiro era o “Príncipe” Dirceu Lopes. Zico era o Galinho de Quintino, de tão franzino que era na adolescência. Um zagueiro que entrou para a história do Atlético Mineiro tinha nome de refrigerante: Grapete. Reinaldo virou “Rei” e pronto. Também, com tanta majestade, teria de ser Rei ou Santo. No futebol paulista houve um jogador de nome Santo, devia ser pelo comportamento fora de campo, pois como um foguete molhado, nunca estourou. Mas tivemos um atacante de nome Foguete, no Atlético. Gerson era o “Canhotinha de Ouro” ; Roberto Rivelino a “Patada Atômica”; Pelé sempre foi Pelé, mas antes de sempre, tentaram com ele o apelido de Gasolina que não colou e o familiar Dico, ficou restrito a dona Celeste e sô Dondinho, que sempre o chamaram assim, carinhosamente. Dondinho chegou a vestir a camisa do Galo, para onde veio com a missão de substituir o imortal Guará, contundido. Só que depois de cinco jogos, aprovadíssimo pela diretoria e pelo técnico, Dondinho também se contundiu e teve de voltar para casa em Três Corações. Bastante chateado com a dispensa, saudoso do lar, Dondinho chamou a jovem esposa Celeste para fazer amor e teria dito a ela no momento supremo do prazer: -meu bem, acabamos de fazer aquele que será o maior jogador de futebol do mundo. E assim foi.

O goleiro bicampeão do mundo, Castilho, era bastante feioso e por isto os adversários o chamavam de Bóris Karloff, um ator que só fazia filmes de terror. Tomires, beque do Flamengo, que só batia da medalhinha prá cima era o “Cangaceiro”. O inesquecível atacante Almir Albuquerque, cuja vida é um roteiro pronto para um filme espetacular, por razões óbvias era o “Pernambuquinho”. Heleno de Freitas outro imortal do ludopédio (epa!!!) espumava de ódio, quando a torcida adversária o chamava de Gilda. Alusão á temperamental, linda e talentosa atriz Rita Hayworth, que estourou mundialmente com o filme “Gilda”. Garrincha, que na pia batismal foi chamado de Manoel Francisco, nos campos era o “anjo das pernas tortas”. Telê era o “fiapo de esperança”. Luizinho, do Corinthians, era o “pequeno polegar”. O goleiro Gilmar apelava quando o chamavam de girafa. O América do Rio teve um Flecha na sua ponta-direita; e o Bahia um Baiaco. Fuzil jogou no Atlético; Ticrim, no Guarani de Divinópolis. E o Juca Show? Meu Deus, esse eu vi várias vezes. Jogou em época errada. Hoje, seria o maior de todos. Elba de Pádua Lima, que depois se consagrou como técnico, era penas Tim.

João Ribeiro era o João Coragem. E o Zé, Pulula. Nilton Santos foi a “Enciclopédia”; o russo Yachin, do Spartak Moscow, maior goleiro da história do futebol,era o Aranha Negra. No Paraense tivemos o João Sanfona, também goleiro. E Barrão, inesquecível beque de espera. O meu amigo Edson Dedão, foi campeão mineiro em 1964, pelo Siderúrgica (de Sabará) e Troféu Guará naquele ano como o craque do ano. Didi era o “príncipe etíope”. Certa época, o glorioso Clube Atlético Paraminense tinha em sua defesa: Borracha, Cabinho, Márcio Macaco, Gatão (ou Capacete) e Bôi. Já no Guarani, pontificaram Bolão, Caldeirão, Pavão, Bentivi e Globão. No Paraense também jogou o Tigarida (forma resumida de José da tia Margarida).

Atualmente, as torcidas ditas organizadas, se dão uma importância que não têm, nem podem ter. Influenciam negativamente, a começar pelos apelidos que colocam em seus ídolos: Kleber é o gladiador; temos vários chamados “pulmão de aço”; no América de BH existe um ex-jogador ainda em atividade que atende pelo nome de Guerreiro; qualquer atacante que envergue a camisa nove, logo vira “matador”. Jopgador era artista, hoje é atleta, como de qualquer outro esporte. As torcidas se dividem em facções e em alguns clubes são pagas para irem ao estádio, aliás, arena.

Definitivamente o futebol não é mais o mesmo, e na maioria dos casos mudou para pior.

Eu sou do tempo em que o técnico mandava “arrecuá os harf, prá ivitá a catástre”. Hoje eles mandam matar, pegar, bater. Os torcedores de QI mais baixo, entendem literalmente, como se a ordem fosse dada a eles e então acontecem todas essa tragédias semanais. (Luiz Viana David)

Luiz David

One Comment

  1. Antigamente, rivalidade era sinônimo de molecagem, de sacanear o amigo do outro time por causa da derrota. O outro time era apenas adversário. Hoje, rivalidade é sinônimo de agressividade, não se quer mais sacanear o adversário mas sim agredir. O outro time passou de adversário a inimigo. Torcidas do mesmo time, de facções diferentes, brigando entre si. É importante que dirigentes, técnicos e jogadores não deem maus exemplos. Quanto ao jogo, o futebol hoje mais parece um totó humano, com a bola sendo rebatida no meio campo e de vez em quando sobra alguma para o gol. Cada vez mais o nosso futebol se parece com o futebol americano – não o da seleção americana, mas aquele da bola oval, com brutamontes impedindo outros de avançarem. Mas é com isso que a nova geração vai conviver e passar a torcer. Quanto aos nomes, hoje os jogadores já tem nome e um dos sobrenomes. Daqui a pouco terão nome e sobrenomes completos e, de tão parecidos, no futebol limitado e no corte de cabelo, acabarão tendo nas camisas o número do CPF. Vida que segue e privilégio de quem viu grandes jogadores como os que você citou.

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