0

OFICIALISMO FAZ AGONIZAR O FUTEBOL AMADOR DE PARÁ DE MINAS

Escrevo  este artigo quando falta apenas uma semana para o inicio do campeonato de futebol amador de Pará de Minas, o 37º,  desde que foi fundada a Liga Desportiva. Neste ano a maior novidade é o patrocínio da competição por uma rede de supermercados, cujo principal diretor é torcedor, eu não diria fanático, mas, assíduo, do esporte, que um dia fez a glória do Brasil.

HÁ alguns anos que vou aos campos de nossa várzea apenas esporadicamente, depois de dedicar boa parte de minha vida, quarenta anos para ser específico,  ao nosso futebol amador de um modo mais amplo e, particularmente ao meu querido Clube Atlético Paraminense. Como atleta fui uma lástima, um grande perna de pau, um pereba, como eram chamados os jogadores ruins de bola,  mas consegui ao longo dos anos piorar muito. Depois, virei dirigente e técnico, ou melhor, escalador de times, como tal, sem nenhum surto de falsa-modéstia ou estrelismo, considero-me um dos melhores do futebol patafufense. Presidi meu clube do coração e a Liga Desportiva, e deixei minha marca nessas duas importantes instituições esportivas de nossa cidade. Como técnico/escalador de time/diretor de futebol, fui campeão “apenas” doze vezes, oito delas na fase pós Liga. Fiz centenas de amigos em todos os clubes da cidade e da zona rural do município, em  muitos deles colaborei na sua fundação. Essas amizades conquistadas durante quase meio século perduram, pois num meio onde nem sempre todos primam pela lealdade, fiz questão de ser sincero. Esses amigos de longa data são o legado que trouxe comigo e guardo todos eles em lugar especial de meu coração.

MESMO quase não indo mais aos campos, acompanho diariamente o noticiário futebolístico patafufense, pois o meu círculo de amizades continua sendo de pessoas que, como eu,  amam o futebol. Eu praticamente saí do futebol, mas o futebol não saiu de mim. É nesta condição de observador, que costumo dar meus pitacos no vai-e-vem do nosso envolvente ambiente  esportivo. Agora, com maior isenção, pois desde 2005 que o glorioso CAP não participa das competições da Liga. Assim, não posso ser acusado de ser parcial e apaixonado, num ou noutro ponto de vista.

PESSOALMENTE, acho que o futebol amador jogado em Pará de Minas até o final do século passado, era melhor tecnicamente e a torcida muito mais entusiasmada e frequente nos estádios. Nas poucas vezes que fui ver uma partida, desde 2007, sinceramente confesso que não vi mais do que dois ou três bons jogadores; o atacante Guilherme Morais, o zagueiro Côco e o atacante Acarajé, que poderia ter sido grande, mas não quis, consciente ou inconscientemente. É verdade que desde a década de 1990 a qualidade técnica dos nossos futebolistas vem caindo, ao ponto de nos anos 1990 apenas dois jogadores, na minha modesta opinião, se destacarem, o meia Zinho Peixoto e o centroavante César, o melhor de todos os citados até aqui.

SIMULTANEAMENTE a queda da qualidade técnica, a torcida foi se afastando das arquibancadas, ao ponto de no últimos dez anos, nem a partida final do campeonato, motivar mais o torcedor. Foram jogadas para menos de trezentos espectadores, num evento que anteriormente lotava até as grimpas, qualquer estádio da cidade. A torcida campeã sempre  fazia grande barulho nas comemorações que duravam dias. Agora não mais, quem não é aficcionado,  nem fica sabendo que houve uma final de campeonato, nem que o São Francisco foi campeão pela milionésima vez.

SEMPRE externando a minha opinião pessoal, penso que a politização do nosso futebol amador está contribuindo para essa queda. Constitucionalmente o Estado (União, estado e município) são obrigados a incentivar a prática do esporte amador. Nos últimos quinze anos, esse incentivo em Pará de Minas, passou a ser adotado o critério de subvencionar os clubes com determinada quantia em dinheiro, para gastarem como quiserem. Sempre defendi que essa verba devia ser investida em equipamentos físicos, que dotassem os clubes de condição para revelarem novos atletas. Com o dinheiro nas mãos, nossos dirigentes partiram em direção inversa, gastando toda a verba recebida com pagamento a jogadores, na maioria de outras cidades, o que acabou por sufocar o surgimento de novos valores. Isto, aliás, pode ser uma das causas do afastamento da torcida, que a partir do momento que ia ao campo, mas não conhecia nenhum   jogador de seu time, ficava até constrangida em torcer. Ao mesmo tempo, as jovens promessas, cansadas de figurarem sempre no banco de reservas, vendo jogar atletas cuja maior credencial é “ser de fora”, foram desistindo do futebol, passando a dedicar sua energia a variados outros esportes, como ciclismo, artes marciais, corrida de rua, esportes de quadra (vôlei, basquete, handebol).

MAS, a aproximação da política e futebol em Pará de Minas, foi ainda mais danosa, a partir do momento em que a Liga Desportiva passou a ser um apêndice da Diretoria de Esportes da prefeitura. Sendo que desde 2013 tal diretoria foi elevada à condição de Secretaria Municipal de Esportes. Mesmo tendo à frente da secretaria  notórios dirigentes do futebol, a emenda ficou pior do que o soneto, a tal ponto que o diretor técnico da Liga passou a ser um dos gerentes da Secretaria, de forma que o dirigente de clube não  sabe se está tratando com o gerente, ou com o diretor da LDPM.

DESDE que se deu esse conúbio entre política e futebol, a situação piorou para a maioria dos clubes. Os tradicionais Paraense e Paraminense sumiram dos campos. O Guarany o segundo mais antigo clube da cidade, fundado em 1938, caiu duas vezes para a segunda divisão, criada aliás, desnecessariamente. Sendo que uma das quedas foi por decisão administrativa. Os times da vizinha cidade de  Igaratinga, sempre fortes, desapareceram por muito tempo, ao ponto de  o Atlético de Antunes, chegar a ser punido com dois anos de afastamento. O Torneiros E.C., de nosso maior distrito, campeão em 1996, está paralisado há anos.  O Rio Branco, time de maior torcida da cidade, vive uma crise eterna nesses quinze anos, praticamente caindo de divisão ano sim, ano não.   O Pequi E.C. da vizinha cidade, que  por muitos anos abrilhantou nosso campeonato, sendo campeão algumas vezes, foi perseguido fora de campo,  e dentro dele por arbitragens ruins, até cair para a terceira divisão.

CURIOSAMENTE, todos os times que porventura em algum momento, pudessem fazer sombra ao São Francisco F.C., foram caindo em desgraça no contexto de nosso futebol. Com adeptos declarados do clube ocupando cargos de direção na Liga, no Departamento de Árbitros, na Diretoria Municipal de Esportes (agora Secretaria, cuja cúpula é ligada ao clube), e mesmo na mídia local, que em determinado momento pareceu ter esquecido dos demais clubes, o tricolor se agigantou. Internamente, um grupo coeso assumiu a direção do clube e com objetividade o levou a grandes conquistas, até mesmo regionais. Hoje o time é um gigante regional, pena que para crescer tenha contribuído substancialmente  para que todos os demais ficassem mortalmente debilitados, incapazes de lhe fazerem frente, seja técnica, administrativa e, principalmente economicamente. Não foi atoa que o já saudoso ex-presidente do São Francisco, meu amigo fraterno,  José Maria de Castro, durante a última visita que lhe fiz, ao comentar o período de ouro e de conquistas de seu clube, reclamou da falta de adversários à altura para o São Francisco nos campeonatos que ganhou. Ele preferia ter visto seu time enfrentando os fortes e antigos adversários Paraminense, o Rio Branco, o Guarany, ou Paraense.

ATUALMENTE a Liga de Pará de Minas é presidida por Geraldo Magela de Faria, o Dogás, de quem tenho o privilégio de ser amigo pessoal há quase cinquenta anos. Dogás é um fenômeno, é um dos três melhores goleiros da história do nosso futebol, dentre os que eu vi jogar, foi certamente o melhor. É um fenômeno porque segue em franca atividade, aos sessenta e cinco anos (apesar de ele dizer que tem apenas 53), no time master da AABB/Pará de Minas não tem para outro goleiro. Com um ano e meio à frente da Liga, Dogás vai presidir seu segundo campeonato. Converso com ele diariamente na loja onde é diretor/gerente, ou na roda da  padaria Paladar, onde somos assíduos, , sei que ele está com a cabeça fervilhando de boas idéias para o nosso futebol. Graças ao empenho dele, foi firmada a parceria com a rede de supermercados BH, que bancará os custos da competição.  Penso que Dogás enfrenta como maior problema o comodismo e o achismo de boa parte dos diretores de clube. Muitos acham que por ser ele (Dogás) irmão do prefeito Antonio Júlio, irá chover dinheiro público na Liga. Não vai, a prefeitura está apertando os cintos, inclusive fazendo dezenas de demissões. Não há muito dinheiro para o futebol  e os clubes já foram avisados disto.

GERALDOGÁS   nunca me pediu opinião sobre a Liga, até porque eu apoiei outro candidato na eleição em que ele foi escolhido, depois de uma série de conversas desencontradas e fofocas, provocadas por pessoas que ele sabe quem. O importante é que nossa cinquentenária amizade não ficou arranhada.  De forma que não me sinto constrangido de opinar que está na hora de acabar com essa amigação entre Liga e prefeitura. Os clubes precisam parar de mendigar migalhas que não resolvem o problema de nenhum deles. Que cuidem de fazer um campeonato digno, bem organizado, que promova a reconquista dos torcedores e motive o investidor, que pode ter vindo para ficar, a seguir patrocinando   o evento.

ESSE tipo de oficialismo e dependência  do nosso futebol acabou por levá-lo à decadência.  O presidente da Liga, que já pegou a casa em ruínas,  deve ser o grande condutor desta  memorável ressurreição.

Apoio para fazer as mudanças ele tem.

Luiz David

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.