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DELIVERY

DELIVERY – Está no “Google Tradutor” : Delivery é a palavra em inglês que significa entrega, distribuição ou remessa. Esta palavra é um substantivo que tem origem no verbo deliver, que remete para o ato de entregar, transmitir ou distribuir. Delivery consiste no transporte e entrega de cartas ou outros tipos de bens.

DÉLIVRANCE – Está no “Dicionário Informal” :1. Délivrance – Parto, Resolução do parto. Clinicamente, o estudo do parto analisa três fases ou períodos principais(dilatação do colo do útero, expulsão do feto,e secundamento, dequitação, ou saída da placenta).

No passado, a palavra ‘délivrance’ era bastante citada nos jornais impressos, especialmente por repórteres que faziam a cobertura das delegacias de polícia. Aos sete anos eu já lia os jornais que meu pai levava para casa, geralmente o “Estado de Minas” ou o “Diário da Tarde”; eventualmente um jornal chamado chamado “Binômio”, cuja eventualidade na casa se devia por ser um semanário. Eu lia aquela palavra mas não sabia o seu significado, no dia que perguntei a minha mãe do que se tratava, ela preferiu ler a matéria antes para se inteirar do assunto. Como resposta mandou que eu perguntasse ao meu pai, mas à notinha quando ele chegou em casa, a bronca que a minha mãe lhe deu foi grande, e eu gravei na memória parte de sua última frase:: -… E pare de trazer esse tipo de leitura para dentro de casa! Pelo sim pelo não, preferi não perguntar nada e só na adolescência, já morando em Pará de Minas tomei conhecimento da etimologia da palavra, durante aula de francês proferida pelo saudoso professor dr. Hélio Fábio Torres. O mestre “en passant” (a aula era de francês, lembram-se? ) disse que dependendo do contexto “délivrance” podia significar aborto; e mais não disse. Como a classe era mista, o mestre preferiu avançar para não ferir suscetibilidades das mocinhas presentes. Eu tinha uma ideia muito vaga do que era um aborto, então no dia seguinte dei um jeito de passar pela sapataria de consertos do Tó do Munerato, que era uma espécie de consultor informal da rapaziada, para assuntos alusivos a sexo, doenças de rua (hoje conhecidas por DST), como lidar com a primeira namorada, essas coisas. Tó do Munerato sabia tudo e explicou-me direitinho o que era um aborto. De quebra mencionou pelo menos meia dúzia de mulheres da cidade abortadas nos últimos tempos, consideradas pudicas e virgens, entre elas algumas beatas de comunhão diária; e os pais dos bebês abortados. E ainda deu nomes às “fazedeiras de anjinhos”, como ele se referia às mulheres que faziam aquele tipo de tratamento para a grávida expelir o feto. Isto se passou a quase sessenta anos e creio que todos o mencionados pelo Tó, já morreram. Inclusive ele, que por ter sido um grande atacante do glorioso Rio Branco F.C. teve a bandeira do clube colocada sobre seu caixão durante o velório.

Quando a palavra “délivery” começou a se popularizar no Brasil sempre que eu a ouvia ou lia, pensava logo numa délivrance; acredito que no fundo as duas devem ter uma origem comum. Eu não pronunciava a palavra e nunca a tinha escrito antes, até agora. Já faz muito tempo que eu sei o seu significado, mesmo assim sempre preferi a sua tradução em português: délivery não passa de “entrega em domicílio”, simples assim. Essa mania besta do brasileiro de incluir palavras inglesas no seu dia a dia foi que a popularizou. Até o Zé da Venda da esquina está pronunciando (corretamente) a expressão. Outro dia estive no seu negócio para comprar uma rapadura e ele como se anunciasse a descoberta de novo planeta na galáxia, me disse: – ó, prá clientes que compram a vista e moram nas redondezas, estou atendendo DÉLIVERY; é só ligar que eu mando entregar. Dei-lhe um beliscão na bochecha e respondi: moderninho hein Zé? Délivery né mesmo?

Fico pensando nos comerciantes de minha infância, donos de armazéns, açougues, farmácias, lojas de roupas e de calçados, anunciando “délivery” em seus reclames, em vez do popular entrega em domicilio. Sô Zé Mendonça, dono do mais popular armazém de secos & molhados não prosperou apenas com o que vendia no balcão. O negócio tinha até mesmo uma carrocinha para fazer as entregas das mercadorias encomendadas pelas famílias. E pessoas que depois se tornaram ilustres pilotaram aquela carroça: uma delas depois foi o prefeito da cidade, José Porfirio de Oliveira; outra foi Geraldo Marinho, tesoureiro do município por mais mais de trinta de anos; Sylvio Gonçalves David, que depois inscreveu-se em concurso para o Banco do Brasil onde fez belíssima carreira. Mais tarde foi atleta profissional do América e do Cruzeiro de Belo Horizonte e mais tarde ainda diplomou-se árbitro de futebol, tornando-se um dos melhores dos quadros da FMF e da CBD (atual CBF).

Mas, as mercadorias também eram entregues em bicicletas e os caixeiros (balconistas) hábeis na direção de uma ‘magrela’ eram disputados pelos donos de açougues e armazéns, principalmente. Ficaram famosos praticando a délivery: Amadeuzinho Flores (Armazém do José Gentil); Antonio Arnaldo defendendo a mesma camisa; Geraldo Mendes, o Alemão, que anos depois, de tão popular que era, elegeu-se vereador; os meninos do açougueiro Wilson Amarante e outro bastante conhecido: Careca, um sujeito parrudo e branquelo, tinha esse apelido por ser de fato o dono de uma luzidia cabeçorra. Careca trabalhava na Casa de Carnes Aurora, dos irmãos Vasconcelos e tinha a habilidade de, da rua, sem apear da bicicleta atirar o embrulho de carne pela janela da residência até á cozinha. Mais tarde ele se casou com uma viúva mãe de vários filhos, entre eles meu dileto amigo Romeu Corrêa Viana, que há muitas décadas mudou-se para o interior de São Paulo, onde é próspero comerciante. Careca morreu relativamente jovem, acometido por uma doença degenerativa que lhe paralisou os músculos.

A Farmácia Cruzeiro, do Jurandir Leitão, não só praticava délivery, como o próprio ‘Juranda’ atendia a freguesia em casa na aplicação de injeções; inclusive durante a madrugada. Os médicos, quase todos, também visitavam os pacientes em casa (a expressão ‘médico de família’ vem desses abnegados): doutores Edward, Jacinto, Silvino, Olavo, José Lage. Advogados se revezavam em visitas às residências de famílias abonadas que tinham parentes falecidos recentemente.

De repente o telefone tocava no Bar Elite e o dono, Zé Dureza atendia. Do outro lado era o deputado estadual Wilson de Melo Guimarães que dizia: Ô Zé, aqui é o Wilson; me mande aí uma dúzia de cervejas e um filé à parmegiana. Cheguei cansado da capital e vou ficar em casa.

Como se vê esse lance de délivery é tão velho quanto andar prá frente. Escrevi uma crônica, onde citei pessoas que marcaram a minha juventude e via facebook / messenger encaminho a todos vocês, numa espécie de entrega a domicilio cibernético on-line.

Bom fim de semana a todos. (LUIZ VIANA DAVID)

Luiz David

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