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CEGEZINHA, ADEUS!

CEGESINHA, ADEUS! 

Deu no jornal “A Honda confirmou nesta sexta-feira (1) o fim da produção da CG 125 no Brasil. Lançada em 1976como a 1ª moto nacional da marca japonesa, ela foi a mais vendida do país por décadas”.

No Brasil a motocicleta de 125 cc da Honda está para os motociclistas, assim como o fusca da Volkswagen está para os donos de automóvel. Uma relação de pura ternura. Eu comprei uma “cegesinha ” em 1981, mas antes dela, fui dono de outras dois veículos de duas rodas. O primeiro foi uma Lambretta, daquelas grandes e pesadas, modelo italiano, pilotando-a percorri quase todas as cidades no entorno de Pará de  Minas, num raio de até 150 quilômetros, quase sempre em estradas de terra. O ano era o de 1974 e eu trabalhava na Minas Rural, a primeira revenda autorizada da Ford na cidade e visitava clientes  da empresa. Certa tarde, chegando de alguma viagem, parei  para um dedo de prosa no Bar do Zé Pretinho (Wallace José de Almeida) que ficava na esquina de Rua Tiradentes com Praça Melo Viana. Zé Pretinho tinha sido um colega de trabalho na fábrica de tecidos e quando saiu de lá comprou o bar. Na juventude ele tinha sido um dos astros do melhor time de basquete já formado na cidade, pelo PMTC, como sempre atesta outra estrela daquele time, Miguel Ângelo Grassi, o Miguelão. Conversa vai conversa vem, de repente Zé Pretinho diz que era apaixonado por lambretas, pela minha particularmente. Se eu topasse, ele trocaria a moto Honda de 50 cilindradas que ele possuía pela minha lambreta. Para testá-lo, eu disse que faria o negócio, desde que houvesse uma “volta” em dinheiro, No fim da conversa, ele ofereceu uma certa quantia e eu topei. Saí do bar já pilotando a “cinquentinha” e ele foi embora no lambretão, que conservou até a sua morte. No dia seguinte, apresentei-me na empresa pilotando a motinha, que além de ser muito mais econômica do que a lambretta, também desenvolvia velocidade maior.  Meus colegas de trabalho se encantaram com a cinquentinha: Humberto Vasconcelos, Mauro Marques, Toninho Felipe, meu chefe Horácio Dantas Duarte, e principalmente um jovem branquelo e muito magro, aprendiz de balconista na casa de peças da agência de nome José  Márcio de Sousa, que poucos anos depois ficaria famoso como o “Zé Márcio da Moto-Star”, uma das maiores revendedoras de motocicletas do Brasil ainda hoje, quando a empresa é administrada pelos seus filhos. A primeira motocicleta que ele pilotou em sua vida foi aquela cinquentinha que eu negociei com Zé Pretinho. Muitas vezes José Márcio pedia a moto emprestada para ir almoçar em casa, que ficava em frente à Copará, nos terrenos do ex-governador Benedito Valadares, onde depois surgiu o bairro Senador. Ninguém precisou ensinar ao José Márcio como pilotar o bicho; ele apenas montou e foi saindo. Muitos anos depois ele me disse que naquelas ocasiões ele ia até o “alto da maniçoba”, na estrada antiga de Belo Horizonte. ainda calçada de poliédros. Só na volta é que passava em casa para comer rapidamente, antes de estourar a hora do almoço. Fiquei com a cinquentinha por algum tempo, até 1976, quando deixei a Minas Rural. Vendi-a bem no jeito para o colega Humberto Vasconcelos, que depois a repassou para o irmão dele, Walter.

A cegesinha eu comprei num consórcio e pilotando aquela “potência” ampliei meus horizontes, indo muito mais longe. A “febre da motocicleta” tinha atacado em Pará de Minas e centenas delas, alguns poucos milhares, já infestava as ruas da cidade, algumas bem barulhentas, principalmente aquelas pilotadas pelo Lindorifo Faria e pelo Arquimedes (Medinho) Marinho. Era a época dos famosos “KM de Arrancada” que aconteciam por todo lado e no Pará, na pista em torno da sede do D.E.R. Um verdadeiro caso de polícia, que comparecia sempre no local e costumava multar até quem estava só assistindo os pegas. Montando a minha CG fui com um grupo ao Rio assistir a um Flamengo  X  Atlético (3 a 1 Fla) e na volta pegamos uma chuva desde a Serra de Petrópolis até chegar na Matinha, onde o sol da tarde brilhava maravilhosamente. Em Guarapari e outras praias do Espírito Santo fui algumas vezes, uma delas em companhia do Ronaldo Teixeira (Pardal) e do mencionado Medinho Marinho. Nesta viagem Medinho levou um garupeiro, o Tuca Despachante, o mais simpático anão de Pará de Minas ,lembram-se dele? Não se fazia selfie naquele tempo, mas imaginem o Tuca viajando em pé na garupa da moto, pois sentado os pezinhos dele não alcançavam o estribo. E com as mãozinhas atacarradas nos ombros do Arquimedes. Foram seiscentos quilômetros de pura emoção; mil e duzentos se contarmos também a viagem de volta. Em Guarapari montamos a barraca numa área de camping e fomos curtir a praia.

Durante a viagem muitas vezes eu perdia os companheiros de vista, pois eles, sempre a 110/hora em média; enquanto eu nunca passava dos oitenta. No entroncamento com a 381, que segue para Ipatinga eu fiz o contorno e rodei mais de uma hora até ser alcançado pelo Pardal que pacientemente me mostrou que eu entrado errado no trevo e por ali eu parar em Governador Valadares. Nunca mais esqueceram disto e sempre fazem questão de lembrar quando nos encontramos. Os dois, Ronaldo Pardal  e Medinho, agora casados e respeitados pais de família, continuam nas estradas,  montados em possantes máquinas de mais de mil cilindradas. Não diria que estão ricos, mas estão  com os respectivos burros na sombra. Eu, quando cheguei aos 85 quilos (chegaria aos 108) despedi-me de minha cegesinha e nunca mais tive outra. Sobre Tuca, pouco tempo depois ele se mudou para São Paulo e através de concurso empregou-se na Câmara Municipal, há muitos anos não o vejo.

 

Honda CG 125 de 1976 â?? Foto: Divulgação

Luiz David

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